foto

foto

ninfeias

O NINFEIAS, núcleo de pesquisa coordenado pela pesquisadora e performer Nina Caetano - professora do departamento de artes cênicas da UFOP - visa a investigação de teorias feministas e práticas performativas. Funciona como uma rede colaborativa, instigando a provocação artística, encontros e trocas entre estudantes da Graduação e da Pós Graduação da UFOP e a comunidade ouropretana.
Atualmente o NINFEIAS é composto por Amanda Marcondes, B. Campos, Caroline Andrade, Caroline de Paula, Caroline Moraes, Danielle dos Anjos, Giulia Oliva, Jackeline Análio, Keila Assis, Marcinha Baobá e Renata Santana.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

3 horas de prosa, as 3 histórias e as três Marias.

Maria, esta é Maria. 
Maria, esta é Maria.
Maria, muito prazer: meu nome é Maria.
Dia de luto: Marias viúvas que lutam.
Homens violentos que morreram primeiro.
Os 4 tiros, o facão amolado toda noite embaixo da cama: "Hoje você vai trabalhar nesse quarto".
A fome, a rapa de arroz na casa da vizinha, os 4 filhos, o tapa na orelha que ainda dói: "As mulheres da zona são melhores que você".
Ser evangélica para agradecer a obra de Deus: Ser viúva foi milagre.
"Olha aqui a marca do tiro. Deus me salvou da morte."
"Santa Efigênia tem uma casa nas mãos. Eu estava desesperada e pedi uma casa para ela. Uma casa em minhas mãos também."
Comigo também, Maria.
"Quem casa quer casa. Eu queria ir embora da casa"
Maria, eu não sou evangélica. Mas eu sou mulher.
Maria, eu não sou católica. Mas eu sou mulher.
Me dá um abraço.
Maria, eu não quero parar de conversar com você.
dá seu telefone, eu quero guardar essa foto.
Eu mando prá você.
Eu perdoei a outra mulher dele. Somos amigas.
Eles estão mortos. Mas poderia ser a gente.
Maria com a bíblia na mão, agradece.
Maria, muito prazer. Esta é Maria.
Maria, muito prazer. Esta é Maria.
Choramos cortando nossas cebolas.
Nossa, já é hora do almoço.
Eu nem vi o tempo passar.
Volta?
Volto.
Eu também nunca vou me esquecer de você.
Maria, até logo.
Maria, até já.
Maria, boa tarde.
Maria, até outro dia.


(Thaiz Cantasini - 
Ação Por Marias e Evas - 
18/12/15. 
Das 9 ao meio dia.
Cachoeira do Campo-MG)

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

ARTE/VIDA, FEMINISMO E O SOM DO CHUTE NO CÁRCERE.

                                                                         Thaiz Cantasini

Sinto-me vitoriosa por ser separada e ter caçado meu próprio canto. Adoro minha casa, a varanda sem horá
rio, o pé de manjericão, meu pisca-pisca ligado na sala sem ser Natal. A casa é alugada, mas é o melhor que posso fazer por mim e por minha filha agora. Gostamos tanto daqui!
Mas não se engane, leitorx: a vida não deixou de esbofetear e de rir da minha cara. Mas agora com uma diferença: sei responder, afiei minha língua nessa pedra-de-amolar (que é o cotidiano) e apurei o meu silêncio ao ponto de tornar-me completamente indiferente ou no mínimo piedosa quando a vida resolve ser cínica, arrogante ou babaca comigo. Uso a palavra vida aqui como uma metáfora.
Foi importante ter estudado e ainda estar estudando. Eu tenho 35 anos e faço mestrado em Artes Cênicas.
Estudando pude conhecer outras mulheres, trocar conhecimentos, revigorar vida e arte, livros e con-vivências. Toda mulher pode romper o exílio. E outras vão nos acolher porque nós sabemos umas das outras.
Comecei a escrever este texto depois de pensar no meu exílio e hoje consigo perceber que estou em movimento. Não nasci prá ficar estacionada. Não sinto tesão por gente estacionada.
Digo isso depois de engolir um marasmo enorme e por isso hoje sou mesmo insuportável. Sou insuportável porque não caibo em mim, estou em estado de criação e de poesia o tempo todo. Descobri que transbordo e aviso para as outras que o casamento precisa ser reinventado desde o termo, que esse negócio de fundir e virar um, só faz mesmo, com o tempo, é anular quem a gente é. Não posso falar pela experiência de todas, mas eu, cá com meus percalços, arrisquei-me em exercitar ser várias, experimentar a dimensão da minha existência e não justificar o que opto quando o assunto é o MEU corpo.
Eu não me censuro porque descobri que tenho direito de ser e de respeitar meus desejos, meus sonhos. Eu atropelei por muito tempo os meus devires e por pouco não os matei: fiz um curso de Direito por 9 anos querendo o tempo todo estudar teatro...e quando saí, exigiram que eu carregasse só a culpa já que havia renunciado o diploma (“Tadinha, ela não deu certo”). Abaixei muito a minha cabeça para um bando de homem dentro e fora de casa. Acorcundei. Cedi o meu corpo como coisa aí pro mundo porque não era senhora de nada, nem senhora de mim. Obedeci demais. Obedeci porque tive medo. Obedeci porque “se não obedecer, apanha”. Mas a surra maior que a gente leva é por obedecer demais. Eu fugi de casa, eu fugi do curso que não queria fazer, eu fugi do casamento. Escapei, mas não ilesa. Nunca estamos ilesas. E faço arte hoje pelas brechas que encontro para fugir das prisões desse cotidiano-mulher que estica seu tapete de sangue vermelho-ancestral e eu quero uma história diferente das que conheci.
Eu teria virado nada se não descobrisse que eu sempre fui uma feminista (e isso gritou depois da morte de minha mãe em 1996, quando a família achou que eu precisava de vigília reforçada por ser a única mulher da casa: casar virgem, ter horário para chegar e sair, fechar as pernas.) e que existem mulheres com histórias parecidas com a minha...e que nem todas estão vivas (ou autorizadas) para um papo reto sobre isso. Sim, nós deixamos de fazer muita coisa por sermos mulheres.
Casar e ter filhxs foi para muitas a única possibilidade de destino.

Deixe-me escrever um poema por dia e aos poucos vou sendo o que eu achar melhor prá mim.
Faço isso por minha filha, Eva.

A maneira mais sincera do meu fazer artístico se dá porque eu me reconheço como uma mulher feminista. Porque nada que eu faça no âmbito das artes anulará a mulher que está inscrita em mim. E eu não faço arte pela metade: Meu corpo está para o meu discurso. Minha pele está para a minha geografia fêmea. Minha voz está para as vozes que calei e quando eu cantar estarei rompendo essa mordaça.
A gente só percebe o quanto obedece quando tem a chance de respirar. Eu respiro neste aqui e agora, na intocável impermanência deste instante (apesar do meu vício irrevogável pelos cigarros de palha: herança daqui das Minas Gerais).
Este escape para sentir o sabor da própria pele e a possibilidade de amar nosso corpo no mundo como potência impossível e precária, insuportável e poética, nos dilata: somos de novo paridas. Lançadas no mundo e encontramos umas nas outras molhos densos de chaves que podem romper portas enguiçadas, insistentes vigílias, ferrolhos e cárceres.

Por via das dúvidas, sabemos chutar.



.


[Thaiz Cantasini é licenciada em Artes Cênicas e mestranda em Poéticas e políticas da cena contemporânea pelo PPGAC UFOP. Compositora, mãe, poeta, performer e ativista feminista nos coletivos Ninfeias-Núcleo de Investigações Feministas e Coletivo Minas da Voz]

.



quinta-feira, 10 de setembro de 2015

A barbie tem vagina?

dolls de Jake and Dinos Chapman

Da boneca
sem vagina
a menina nada tem

Suas coxas
         não são como as minhas
Seus seios
        não são os ausentes-meus
Sua bunda
       não chegou aqui
Suas pontas
        em mim são pés

Mas ela está aqui
            ela é viva
a vejo na TV
a vejo no PC
a vejo

dolls de Hans Bellmer
Vejo gente que virou ela
ou ela que virou a gente?
                                 não sei
só sei
que a quero!

peço à pai
         mas ele não mora com mãe
peço à mãe
         mas ela chora
   se peço
   ela chora

Disse que também queria
mas que não podia
cresceu assim

Talvez se tivesse
          seria diferente
Branca     alta
     elegante
rica
     loira     peituda
talvez            se tivesse
seria gente
               ou
ainda seria como a gente?

A única coisa desse 'corpo' que se assemelha ao real, ao agora da menina, seria sua vagina. Que deixa de existir, e, assim, a menina deixa de existir.
www.acaboclavaifalar.blogger.com

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

história da sexualidade, foucault 1

versão 00 Fichamento – História da Sexualidade, a vontade de saber, v 1, Michael Foucault “Segundo Foucault, a sociedade capitalista não obrigou o sexo a calar-se ou a esconder-se. Ao contrário, desde meados do século XVI-processo que se intensifica a partir do século XIX com o nascimento das ciências humanas- o sexo foi incitado a se confessar, a se manifestar.(…). Uma primeira abordagem (…) parece indicar que a colocação do sexo em discurso foi submetida a um mecanismo de crescente incitação (…)” compondo inclusive uma ciência da sexualidade. (Roberto Machado)* Cáp 2 – a hipótese repressiva A incitação aos discursos Foucault contrapõe a hipótese de que a partir do século 17, com a burguesia, surgiria um período de repressão sexual e que dela haveria vestígios na sociedade moderna. Para ele, entre o século 17 a 20, há uma explosão do discurso sobre o sexo. Talvez tenha ocorrido uma depuração do vocabulário permitido: “polícia do enunciado”, “onde falar”, situações em que é permitido, relações sociais que permitem falar sobre o sexo e, também, as regiões de silêncio absoluto, onde não pode ocorrer o discurso: relação pais e filhos, patrões e serviçais. Mas, analisando-se minunciosamente, o discurso cresceu, principalmente a partir do século 18. Aumentam-se os discursos no campo do exercício do poder, tanto institucionalmente, quanto pelas instâncias do poder. Sendo que estas apresentam uma curiosidade, obstinação, em apurar e detalhar sobre o sexo. A igreja também incita este discurso, indicando que as confissões dos fieis sejam as mais detalhadas possível, com atos, desejos e pensamentos sexuais. A contrarreforma estimula a prática de confissões, e dá maior gravidade à penitência relacionada as ‘insinuações da carne’: “Tudo deve ser dito”. Para o bom-cristão há a “tarefa de dizer, de se dizer a si mesmo e de dizer a outrem, o mais frequentemente possível, tudo o que possa se relacionar com o jogo dos prazeres, sensações e pensamentos que tenham alguma afinidade com o sexo”, portanto, há a colocação do sexo em discurso. Um efeito do discurso sobre o sexo da igreja do século 17 é a influência e projeção na literatura erótica do mesmo período. As confissões sexuais por ora ditas aos padres tornam-se presentes também na literatura, ambas em primeira pessoa. Mas, enquanto a pastoral procurava gerar “domínio, desinteresse, reconversão espiritual, retorno a deus, efeito físico de dores devido a ‘tentação’ ”, o romancista aspirava repetir, prolongar e estimular as cenas sexuais. Só que ambas trazem a tarefa de se dizer tudo sobre seu sexo, tarefa existente há 3 séculos. Considerando-se estes três campos: Igreja, Instâncias do Poder e Instituições, tem-se que “o sexo é açambarcado e como que encurralado por um discurso que pretende não lhe permitir obscuridade nem sossego”. Não há uma censura sobre o sexo, mas uma “aparelhagem para produzir discursos sobre o sexo”. Sua expansão ocorreu principalmente pelo “interesse público”, em que apresenta seu mecanismo de poder em que tem como essencial para a sua manutenção o discurso sobre o sexo. No início do século 18 associa-se ao sexo um discurso de racionalidade, surgem incitação política, econômica e técnica, a falar sobre o sexo. “Análise, contabilidade, classificação, especificação – há pesquisas quanti e qualitativas”. Já entre os séculos 18 e 19 outros focos suscitam o discurso sobre o sexo, como a medicina, a psiquiatria e a justiça penal. Governos passam a lidar com ‘população’, ao invés de povo ou sujeitos. E nesta população são problematizadas a natalidade, a mortalidade, o uso de contraceptivos, a esterilidade, a idade do casamento, o nascimento legítimo/ilegítimo, a frequência das relações sexuais, todas questões girando em torno do sexo. “A conduta sexual da população é tomada como objeto de análise e alvo de intervenção”, surgem a regulação natalista e antinatalista, a análise de condutas sexuais, e as campanhas. O sexo é julgado legalmente, administrado, gerido e analisado. Torna-se questão de ‘polícia’, não a polícia repressiva, atual, mas a polícia do sexo, que o regula por meio de discursos úteis e públicos, e não pelo rigor da proibição. O sexo tornou-se objeto de disputa ente o Estado e o indivíduo, o que antes era conversado entre crianças e adultos já não ocorre. Outras pessoas é quem falam sobre, há outros pontos de vista e outros efeitos do discurso sobre o sexo. Os colégios do século 18 evidenciam o pensamento e construção focados na regulação do sexo, incluindo precauções, punições e responsabilidades, formulados pelas pessoas que organizavam, autorizavam e arquitetavam o espaço educacional. As evidências constam no espaço da sala, na forma das mesas, no arranjo dos pátios e dormitórios, nos regulamentos de recolhimento e sono. O discurso interno da instituição diz que a sexualidade existe, precoce, ativa e permanente. O sexo colegial torna-se problema público. Médicos aconselham escolas e famílias, pedagogos projetam metodologias, professores falam e escrevem aos alunos. Enquanto na Idade Média havia um discurso unitário em relação ao sexo (da confissão e da carne), nos séculos posteriores via-se que esta unidade discursiva se dispersou, decompondo-se e multiplicando-se. Este processo foi marcado por conflitos entre o discurso confessionário (em primeira pessoa) e os discursos racionalistas. Num período historicamente curto, 300 anos, ocorre um grande acúmulo de discursos sobre o sexo (biológicos, pedagógicos, econômicos, psicológicos, judiciais), e hoje acreditamos piamente que falamos timidamente ou pouco sobre o sexo. Em relação a linguagem do discurso sobre o sexo, Foucault considera que as alterações na expressão/vocabulários em relação ao sexo têm a função secundária de tornar o seu discurso “moralmente aceitável e tecnicamente útil”. A discrição e o mutismo funcionam ao lado de estratégias amplas. Para além do binarismo, que vê ‘o que se diz’ e ‘o que não se diz’, há diferentes maneiras de não dizer, há uma distribuição diferenciada de quem pode e quem não pode falar sobre, há permissões para alguns tipos de discursos. Enfim, será que dizer que não se fala sobre sexo não é uma incitação a se falar mais dele? “O que é próprio das sociedades modernas não é o terem condenado, o sexo, a permanecer na obscuridade, mas sim o terem-se devotado a falar dele, sempre, valorizando-o como ‘o segredo’. ” *As partes entre ("") foram diretamente extraídas do livro. retirado de https://acaboclavaifalar.wordpress.com/

sexta-feira, 24 de julho de 2015

as menor.

no
complexo
das novinhas.


nóis
nas tantas vigas.

ouvi
dizê
que senhor
compositor
daquele complexo
das musicas
que

diz
novinha.

tu
repara
mermão
que
o
som

vibrou
infectou
e
agora
complexo
de julieta
virou
lema
para disputa
de
quem
é melhor.

quer dizer, menor.

quem
é
a novinha
do mc
romantico

virou
tema
de
competição
alheia.

ora,
ora,
já que vivemos
sob a lenda
dos capitais.

tarja fraca

nós leitoras,

feminista radicais. 
feminazi de outras noções. 

a loucura vemos? 
ou são só poetas 
que. 


poemas que. 
poetisa, melhor! 

não, 
pare dessa caretice de refutar gênero. 
sapatões convi. convividas.

então poeta! 
não, seja radical. 

feminazi poesia! 

queria falar, 
volto sem cessar, 
a rosnar, 
a... 

na real 
gostaria de mandar, 
no som do morro. 

feminazi sem tostão. 

mas, a loucura que vejo. 
quando reparo em poemas, 
reparo em poetas
ou daqueles 
que utilizam 
pseudo 
feminismo 
discurso 
alheio 
para ganhar 
proveito. 

homenzinho 
fulaninho de fachada, 
uso do discurso libertário 
para fazer do objeto 
uso inapropriado 
de discurso libertário.

 

sexta-feira, 13 de março de 2015

AÇÃO POSTO DE SAÚDE - SANTA CRUZ

relato do movimento, meu ato de silêncio. a denúncia de vários tormentos.
foi terça feira. preciso expor, vomitar essa ação. meu silêncio implora! abra a boca e escreve sobre tudo. - você ainda está em silêncio? sim... e sinto ainda mais tudo. reviver o que passou, as imagens, tudo...

dia dez de março. começo escrever ás 15h09.

fiquei uma hora de frente a ele.
primeiro chego no bairro, me troco, amarro. os barbantes. amarraram me com seus arames. desci. caixinha de música na mão, a minha proteção. desci, comecei minha ação. dançar, dancei. "não há revolução sem dança." dancei, brinquei. e ele sentado no bar.
antes disso, colando frases contra opressão, o mesmo sujeito passou em nossa frente... - eu preciso olhar a pressão.

- você me olhou e eu te olhei. foi isso.

ainda sem falar. queria tanto gritar! mas preferi cantar. que loucura! que força foi essa?! de pagu, de guerreira, de índia. as forças da minha mãe, da minha avó. para mim, foram mais que uma hora de silêncio. foi um tormento.

- não chora, eu não te fiz nada. não chora.

uma hora que meu corpo cresceu, torturas. eu rezei. pedi a d(D)eus que aquele sujeito se afastasse de mim! o espaço do movimento. meu corpo coberto por amarras.

- ela me petrificou. ela me hipnotizou. eu não fiz nada.

quem diria que a caixinha na minha mão, fosse a minha proteção. quem diria... que aquela música que eu odiava, que fica repetindo e repetindo fosse naquele momento a minha única proteção. fosse a minha arma, a minha espada! ele vinha, se encostava. eu o machucava. agradecia a

- dani, sabe me informar se aqui na santa casa tem tratamento alcoologico? - na hora que eu escrevo o meu relato, vem o universo e retoma assuntos.

eu o machucava. agradecia a d(D)eus por minha caixinha não ter formato de coração. minha caixinha pontiaguda. meu trabalho, um lugar de denúncias. o cheiro da cachaça ainda está na minha memória. eu dizia na minha mente: - se afaste de mim! repreendo. eu ordeno que saia. mas, ele saia e vinha. ele brincava. me olhava e repetia o jogo. saia e vinha. eu precisei cuspir.

- É BRIGA!  ouvi alguém gritar.

com a energia ainda viva, meu corpo, minha cabeça. eu precisei de um cigarro. minha força, herança da minha família. eu não fui pega no laço. eu não deixei que ele me oprimisse.

memórias. eu começando a ação.
dançando com as amarras. das mulheres. comecei e vi que ele me olhava. saiu do bar e foi ver mais de perto a menina -eu- dançar.

- o que esse cara está querendo? pensei comigo... ele me olhou e eu, olhei também... mas, ele não parava de me olhar. chegou mais perto de mim. - santodeus, será que ele quer tocar a caixinha? então eu ofereci a caixinha. ele nada, só me olhava e se aproximava.

chegava mais perto, eu sem espaço. eu não conseguia mais dançar. então parei e o encarei. seu corpo se aproximava cada vez mais perto de mim. cara fechada, sobrancelha cerrada. - porque esse cara está aqui?
o sujeito não me dava espaço. começou a usar o dobro do seu tamanho para me encarar. começou a imitar meu olhar. eu não deixei. isso não vai me amedrontar. continuei. cara fechada. agora era só a caixinha que tocava. durante um tempo era só que eu ouvia. parada. exposição da massa. seu corpo. saia e vinha. me oprimia. eu parada. NÃO! ao meu lado eu não te quero. ENCARO O DE FRENTE. esse jogo continuou. até que ele chegou mais perto do meu rosto. voltou - me olhou de cima em baixo E AINDA POR CIMA MORDIA O LÁBIO! olhava meu peito. me olhava sem o menor respeito. olhos ameaçadores. chegava cada vez mais perto. eu o machucava com a minha caixinha.  chegou mais perto, quase encostou seu rosto na minha boca. ameacei, dei um tapa e falei: - você não me encosta.

- tamo junto. ele disse.
tamo junto. você me conhece. tamo junto.

eu não... eu não acredito nas coisas que ouvi. e hoje, depois de três dias que realizei a ação. ainda escuto essa voz. ainda fica repetindo algumas frases da minha cabeça. o cheiro de cachaça. a caixinha parou.

- TOCA! TOCA! TOCA!
ele não parava de falar.
- FALA! FALA! FALA! FALA!
ele não parava de falar.

- Eu Márcio, você? Você me conhece.
- EU MÁRCIO! VOCÊ?

eu não parava de apertar lo com a minha caixinha. ele ainda sorria. ia embora e voltava. parecia que precisava ganhar mais força com o impulso. me olhava.

- FALA! FALA! FALA!

naquele momento... o meu silêncio, foi o meu porto seguro.


espaço movimento. 
naquele mesmo dia, a noite... eu ainda escrevia.





                                                                              hoje.
                                                                              silêncio.
                                                               hoje
 – você não me encosta.

ela é muda.

gestos, e mais gestos. acho que aprendi direito.

sai!
-toca, toca, toca, toca.
- você está tensa.
- ELA ME PARALISOU.

eu estava amarrada. pés, mãos, tronco e uma linha que cruzava tudo. eu não falava. eu no início, só dançava. ela eu, não rela neu.

- você está bem? achei que fosse uma cena.  nem sei onde esse cara mora.
- ele é garçom.
- ele é doente.
- ele é alcoólatra.

- eu preciso de ajuda. – ele dizia. – você precisa de ajuda.

eu?

a be
bida
a bebida não é nenhuma forma de justificativa para qualquer agressão, ação contra a qualquer mulher. não justifica, não insista.
ele insistia.
vinha de cá para lá.
brincava comigo.
- não chora.
- eu não te fiz nada.
- eu não te fiz nada e te perdôo.

CUSPO! CUSPO! CUSPO!

CUSPI NA CARA. SEM MEDO DE LEVAR PORRADA!
CUSPI NO CHÃO. AVISO PRÉVIO MEU IRMÃO.
SEGUNDA VEZ, CUSPI NO OLHO, CUSPI COM ENGODO.
cuspi, cuspi, cuspi. para chamar atenção de alguém. cuspia.
de mãos amarradas fiz o que podia fazer.
cuspir.

- eu não te fiz nada e te perdôo.
- eu márcio, você?
- fala! fala! fala!
- toca! toca! toca!

a caixinha de música, pontiaguda, meu limite minha proteção.
eu machucava, queria que sangrasse.
e ele saia e vinha. saia e vinha
seu olhar me perseguia.
saia e vinha. olhava, oprimia.

- eu preciso de ajuda.
- porque? porque?
- você me conhece.

- ele é garçom.
- ele ta no bar aqui direto, quando eu saio do plantão, ele está lá. já mexeu comigo várias vezes.
- eu achei que fosse uma cena. hoje é a semana da mulher, né?

eu dançava, essa era a minha ação. ele chegou e não parou de desafiar, de encarar, de insinuar, de cutucar, de implorar, de revidar, de chantagear, de exclamar, de atormentar, de se queixar, de vacilar.

- é igual uma luta, né.
- é uma luta né?
- fala! fala! fala! fala!

ele ordenava, cara de quem ordenhava. jeito de sujeito refeito.

- você me conhece.


conheço. está certíssimo. estudo, pesquiso caras desses jeitos. covardes que usam nós, mulheres para se manterem na posição de macho alfa, procriador. conheço e abomino.  

quarta-feira, 11 de março de 2015

OUVIDOS IMPOSSÍVEIS , 
MULHERES IMPOSSÍVEIS



É preciso subverter as sonoridades opressoras do cotidiano para que ecoe a parafernália vocal entalada da minoria mulher.
Quantas músicas você cantou e que não passaram de uma cantada?
Quantas cantadas baratas viraram sangue dentro e fora das casas?
Se queremos novas escrituras sonoras, que comecemos a retalhar nosso corpo em som e impiedade para desmontar o castelo de chumbo onde somos princesas que repetem frases sem sentido e que, sem percebermos, formaram um hino. Um hino do patriarcado.
Quando subverto a canção, subverto meu corpo inteiro e ouço para além das grades, para além da masmorra.
Quando ouço para além das grades, escuto um oásis, seu movimento inacreditável. Onde mora um cuspe de liberdade. E é esse cuspe de liberdade que possibilita o existir das nossas correntezas.
Cada mulher empoderada comporá a sua própria música.
E quando cada uma cantar a sua, junto com a canção da outra, das outras... não há dúvidas de que o ruído insuportável das subjetividades nos soará harmonioso como quem dorme depois de cessada uma guerra.
Abramos escuta para que o timbre da palavra respeito seja mais estridente que o do fiu-fiu nosso de cada dia.
Escutemos os pássaros do quintal para que possamos alçar os vôos certeiros da águia.



"Tornar audíveis as forças não audíveis, como propõe Deleuze. Afirmar um ouvido impossível no lugar de um ouvido absoluto".  (Artefilosofia n.9 p. 71, 2010)





O vídeo acima é um esboço de trabalho, uma possibilidade que tenho vivido e proposto dentro do Núcleo de Investigações Feministas NINFEIAS. E aqui, com as mulheres do bairro Sta Cruz, em Ouro Preto-MG foi elencada a música "Jesus Cristo", de Roberto Carlos, como música de trabalho de um dos grupos de mulheres presentes na tarde de Ocupação Feminista. Depois de escuta, toque e fios de percepções coletiva, nós avançamos para um trabalho de composição musical para uma nova letra para esta canção. Um exercício.
A mulher compositora traceja sua subjetividade propondo uma marca sonora num tempo-espaço. Leio isso como empoderamento feminino. Porque o tempo musical propõe pequenas fissuras no tempo cronológico. 

Pequenas revoluções cantantes, 

micropoderes em gestação e vazão.

vivenciando soRoridades em soNoridades.




(Thaiz Cantasini)


como somos xxy. ou espaço x.



meu lugar em diversas.

foi as sete. comecei num sábado este espaço. procurei um lugar para troca. não, nego o envelope, aceito o batom. – uma legenda. – peço a escrita a papel e canetas.
EM EXPOSIÇÃO.

 parada, estirada de salto alto. a imagem de mulher exposta. o som da valsa número nove,  achismos para nomes que eu esqueço. valsa de Beethoven? danço. o salto permite movimentos curtos, dança ballética. pulinho daqui ali. pausa.
LEILÃO DE ARTE, 1,99. 8 DE MARÇO ÁS 19H.

oito de março era o dia da mulher né? posiciono. batons, marca de abusos, furtos olhares.  curiosos. paro. não há dança. o rock in roll do lugar não permitia que eu... tentei um pouco.  pequena dança. repito passos para lá e pra cá. um aqui outro acolá. caminhos. viva sem descansar. são sete e quarenta e começo.

passaram uns. olharam outros. eu, na pequena valsa. sangrava de olhares.

- porque eu acredito nisso? porque eu ínsito nisso? e de novo sempre os olhares. vou até o fim.

curiosos:

- olha, ta tocando mesmo.  - mas ela tem um nariz, o que será que ela quer que eu faça? - você não fala?

continuo o passo.  aproxima um de verde e seu acompanhante desnecessário.

- olha lá, ela está com o batom borrado.  provavelmente ela foi beijada a força.

o mesmo chegou seu rosto mais próximo. AMEAÇA um beijo. virei o rosto. o acompanhante??

- você não ri? conhece a piada do pintinho que não tinha cú? foi peidar e explodiu.

desnecessário.

saíram um pouco de vista, mas continuaram a admirar a menina de sutiã. passaram algumas horas. eu cansei. sentei. perna aberta para continuar. passa um fardado. escrito atrás segurança.

- aqui não é permitido sentar no chão. por favor, sente se em um banco. por favor senhor, da um banco para ela. são as regras.

olhei nos olhos. respirei no fundo. meu útero. esse homem não vai estabelecer nenhuma ordem.  levantei e sentei em cima do salto. alto. ele deu a volta com o banco. colocou o ao meu lado. – quem esse cara pensa que é? pois então, ficarei descalça. e foi o salto alto que ele viu sentado.  meus sapatos descansaram.

em pé.

olhares tortos.

 olhares soltos.

 os olhares delas.
  
os melhores olhares.

aqueles das nossas, sorrindo de canto de lado. sentiam se representadas? foi o que me deixou em pé. mais forte, vitoriosa.  os olhares.

mas também havia aqueles que só viam a carne, a minha exposição. aqueles olhares que me queriam no chão. passa um. visivelmente abandado pela sociedade. n a margem. ele com muletas, sujo, algumas sacolas, apenas um dente na boca, me olhou:  DELÍCIA.

eu não ... é isso?

continuei a ação. cansada, sem energia. mas havia a troca dos olhares amigas. delas. olhares deram força.  em pé. em cima do banco. cansei mais. me rendi. sentei. mas de perna arreganhada. sub?
passadas, passada. cansada. 
uma criança me olhou. 
do outro lado sua mãe sorria. 
parou.
 no fundo a vontade de imitar lá. 
mas seu olhar desconfiado, 
de lado, 
parou, 
me arrepiou. 

subiu um monte de gente! ao lado. um aplaudia e meio que gritava: - linda.  depois outro apareceu: -  ta tocando.  ai eu tenho medo disso, já fiz ballet.continuei. 

paro quando?  - posso tirar foto? as fotos ficaram lindas.   
que performance linda. 
olha ela, linda.
 borrada, linda. 
sentada, linda. 
calada, linda. 
olha ela... ta protestando, linda. 
é... a sina? 

por favor, peço que exercite outros adjetivos, coloquem sujeitos... imaginem um objeto...e descrevam o predicado.

segunda-feira, 9 de março de 2015

o oito de março.

dia nove.
- hoje dia da mulher?

me pergunto,
passo em frente aos seus olhos carnívoros.
vejo, o presente dos ISMOS.

droga.
abro a porta
e vejo o plim plim,
que plageia canção alheia.
melodia do "hoje eu quero"
sacrifica o "hoje, eu prezo"

- mas dia da mulher é todo dia!

dizem isso,
mas primeiro vem a paródia.
e para evitar a discórdia...
- que isso, é só brincadeira!

- a lá, a mulher não sabe brincar.

colocam na letra,
da primeira pessoa, falando para terceira(O).
hoje é você que vai lavar,
hoje é você que vai trepar,
hoje é você,
porque a cerveja é minha,
hoje não serei sua menina.

teria algo mais cult
do que mandar ir cagar?

e depois de toda a zombaria,
vem logo aquela tia:
- é só brincadeira, bonita.

esse discurso de ódio,
da emissoras
me apavora.

o ato de
dar flores,
coroa
aquelas que.

-ai.

não quero
concluir.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Qual o clã que se destina: SOMOS TODAS CLANDESTINAS

Sou mãe, amo muito minha filha, mas não compactuo com a morte de milhões de mulheres em abortos clandestinos. A minha escolha foi ser mãe, o corpo é meu. Eu quis! Há de se ampliar a opinião sobre o aborto e compreender que algumas mulheres NÃO querem. E respeitá-las e não permitir que elas morram por isso. Sim, pela autonomia dos corpos: SOMOS TODAS CLANDESTINAS!
Amor e respeito pela escolha, pela autonomia, pelo corpografia de cada mulher. 


Mando aqui uma ótima sugestão de leitura sobre a descriminalização do Aborto. Abraços!


http://renatacorrea.com.br/eu-te-desafio-a-pensar-outra-vez-sobre-aborto/


sábado, 24 de janeiro de 2015

saudando as formigas

"é trabalho de formiguinha!" sempre repeti essa frase para mim, lembrando que o trabalho é árduo e é aos poucos.
as formigas são criaturas belas, delicadas e determinadas, carregam com força suas folhas, doces, e afins e deixam um rastro por onde passam...

hoje eu saúdo as pequenas, as pequenas ações que nos fortalecem para continuar: ao infinto e além.

desde a criação do ninféias, voltei meus olhares para crianças... e hoje, aconteceu algo mágico!
a contaminação começou...

numa tarde de sábado... dentre meus primos, só uma, ela... a menina... que gosta de princesas, barbie, com óculos cor de rosa sempre na cabeça e uma bolsa ao lado, combinado. ao começarmos nossa conversa, perguntei se ela já estudava e sua resposta entusiasmada disse: sim! e ficou tão excitada ao contar todas as coisas queria comprar... depois elogiou a barbie e não tirou o óculos da cabeça... a lágrima que ameaçou a cair dos meus olhos, voltou para o meu corpo em forma de combustão:

- A BARBIE É FEIA! MAGRELA E LOIRA! OLHA PRA VOCÊ... SEUS CACHOS SÃO LINDOS!

-Não, a barbie é linda...

- A BARBIE É FEIA!

percebi o que acontecia... durante nossa primeira conversa ela não tirava os olhos da TV... ousei, desafiei a lei da manipulação e apertei o botão vermelho.

- E livro, você tem lido?

- Aham... E seus óculos se mantiveram na cabeça...  Eu gosto de princesa!

- Que massa! Mas, lembra se... Existem princesas, príncipes, castelos e dragões e tudo isso é faz de conta... VAMOS BRINCAR DE CARRINHO!

a energia contaminou a todos, e logo brincadeira começou...

- Carrinho é legal! Eu gosto!

a minha felicidade virou sol, e brilhei com essa pequena afirmação... depois ao pegar uma folhinha de gibi, entreguei em suas mãos e disse: Olha que massa, leia pra gente... os outros queriam competir ao pegar o papel, mas eu relutei: É a vez dela! e ela leu... usou um pouco da sua imaginação que não foi explorada aos quatro anos de idade e leu! um ponto a mais no jogo...

- Vamos fazer um piquenique? uma voz veio do além!!

- VAMOS!! Todos celebram!

- E a barbie é feia!

- É a barbie é feia... ela disse! Dois pontos...

durante o passeio, brincamos TODOS de futebol... ela se alegrou tanto... e depois, quando se cansou, quis tirar a camisa, mas as outras disseram que é coisa feia:

- ELA NEM TEM MAMILO! ELA É CRIANÇA! fui mais longe ainda... e ela.... minha querida priminha... tirou a camisa e sorriu ainda mais! vários pontos...

AAAAh... que dia bom! termino o dizendo e pedindo que crianças se mantenham crianças....

sendo assim, concluo e saúdo as formigas, sua força, sua determinação e seu rastro invisivelmente visível aos olhos daqueles que acreditam!

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Dos lilazes de cada dia:

NINFEIAS – Núcleo de Investigações Feministas
Ocupação Feminista 25 de novembro de 2014.
Natureza: Relato de vivência
Ação: Oficina com usuárias do CRAS Centro de Referência e Assistência Social – Bairro São Cristóvão – Ouro Preto-MG
Redigido por Thaiz Cantasini

Durante a ocupação realizada aos 25 de novembro de 2014 no Clube Quinze de Novembro, aconteceu a oficina com mulheres sob a condução de Thaiz Cantasini e Karla Ribeiro.
Os jogos trabalhados partiram do estudo acerca do método Boal “Teatro do Oprimido” (Jogos para Atores e não-atores) e  de suas variações com jogos de abertura de ouvidos de R.Murray Shafer contidos em “O Ouvido Pensante” (2009).  Além disso, as oficineiras experimentaram a inserção de práticas nas entrelinhas de ambos os métodos, a partir do instante-já provocando o feminino de cada participante.
A oficina teve duração de 2 horas, estando presentes e ativas: Taynara (Assistente Social do CRAS-São Cristóvão); Natália (Assistente Social do CRAS-São Cristóvão); Diva (Usuária do CRAS – São Cristóvão); Isabela (graduanda em Artes Cênicas UFOP); Cida (Feminista do Sarau das Cachorras); Karla (Oficineira) e Thaiz (Oficineira).
Esperávamos mais mulheres, mas o tradicional tempo chuvoso de Ouro Preto-MG, acreditamos, tenha sido um empecilho para a participação integral das convidadas participantes. Porém, a prática foi realizada e pudemos presenciar e vivenciar um espaço de troca entre mulheres de diferentes realidades. O que foi positivo, uma vez que consideramos, acima de tudo, uma oficina como um espaço democrático-afetivo de experienciação coletiva tendo como objetivo a troca de saberes, percepções e possíveis empoderamentos aos diferentes femininos, ali, em teia, acontecidos.
Pensando em novas maneiras, libertárias, de se viver o feminino no cotidiano e tendo como arcabouço teórico Augusto Boal e R.Murray Shafer demos início a oficina dando ênfase ao corpo de cada mulher e sua construção social aliado á práticas de percepção sonora e composição musical a partir do espaço em que estávamos.
Acreditamos que o processo de criação musical a partir da percepção do espaço em que a pessoa está inserida, altera seu olhar sobre seu “estar no mundo”. Segundo Hermann Hesse, em o Jogo das Contas de vidro,  “A música de uma época harmoniosa é calma e jovial, e o governo equilibrado. A música de uma época inquieta é excitada e colérica, e seu governo é mau. A música de uma nação em decadência é sentimental e triste, e seu governo corre perigo”.
            A realidade de um grupo é explicitada no seu fazer musical. Essas vivências e investigações sonoras captadas no espaço, seja por uma imagem fixa, em movimento, ou mesmo uma memória latente desta pessoa, exterioriza sua maneira de entender o mundo e levanta reflexões de como modificá-lo.
Propusemos perguntas em papeís dobrados e anônimos como: “Como está seu feminino hoje?” e “Do que você precisa se livrar para ser livre?” e a partir das respostas tivemos o material (palavras e sons do espaço) para inserirmos na composição musical coletiva.
Uma das participantes, chamou a nossa atenção por escrever e ler com muita dificuldade. No exercício “Mimosas Bolivianas” de Boal (onde a participante é tocada pelas companheiras aleatoriamente, reagindo a este toque com um movimento contínuo e leve, criando danças pessoais estimuladas por estes mesmos toques), percebemos a dificuldade, também de se movimentar, de Diva. Ao final da prática, Diva dançava com os olhos fechados, já sem nenhum som que a acompanhasse. Um dos momentos mais bonitos da tarde...Em seu relato escrito, que teve a ajuda de parceiras de oficina para organizar as letras como queria no papel, ela escreveu: “Sinto mulher como nunca a tempos”.
Agora, inseriremos aqui fotos dos relatos sobre os femininos das participantes. Diva quis assinar o nome.




Depois das composições musicais e da escuta destas, queimamos os papéis com as respostas da seguinte pergunta: “Do que você precisa se livrar para ser livre?”. Um ritual. As cinzas, a lágrima. Certo grão de alívio. Um recomeço, uma força coletiva pelo fim da violência contra mulheres, contra todas. E um mantra que repetíamos, em coro, observando as cinzas, os nossos “Nãos”:
Eu me amo. Eu me aprovo. Eu mereço o melhor. Eu aceito o melhor agora... Eu me amo. Eu me aprovo. Eu mereço o melhor. Eu aceito o melhor agora... Eu me amo. Eu me aprovo. Eu mereço o melhor. Eu aceito o melhor agora....

Encerramos o encontro com um abraço caracol, aninhadas, animadas...!


Thaiz Cantasini
NINFEIAS – Núcleo de Investigações Feministas